A referência Educação da Linguagem reporta-se à consideração de como Montessori vê a educação de modo geral, relacionada a um processo de autoconstrução no qual o papel do educador, o guia Montessori, é preparar as melhores possibilidades possíveis para que crianças e jovens possam desenvolver de forma plena as suas habilidades e talentos.
Este seria o papel da escola, assim como o da família ou da sociedade: educar = ajuda à vida, para a vida.
“O conceito de uma educação que assuma a vida como centro da própria função, altera todas as ideias educativas precedentes”.
A educação não deve estar baseada sobre um programa preestabelecido, mas sobre o conhecimento da vida humana.
Mas este conhecimento do desenvolvimento psíquico da criança deve ser largamente difundido, então a educação poderá conquistar nova autoridade e dizer à sociedade; “estas são as leis que regem a vida, não podeis ignorá-las e deverás agir em conformidade com elas porque estes são os direitos do homem e da humanidade inteira.” (Montessori, Maria, La mente del bambino 12, Garzanti 1980).
“O primeiro problema da educação é o de prover para a criança um ambiente que lhe permita desenvolver as funções a ele asseguradas pela natureza.” (Montessori, Maria, La mente del bambino 91, Garzanti 1980).
Ao nascer a criança tem pela frente um trabalho especial, adaptar-se ao tempo e ao espaço em que irá viver. Para realizar este trabalho, a natureza dotou-a de características próprias, somente encontradas no homem.
Na sua pesquisa científica a Dra. Montessori descreve a criança como um “embrião espiritual do homem”, pois deve realizar um trabalho formativo, que no campo psíquico, recorda aquele que já desencadeou no campo biológico enquanto embrião.
Neste novo desenvolvimento embrionário, a criança apresenta sensibilidades passageiras para determinadas aprendizagens, denominando os períodos em que isto acontece de período sensível, característico do período de crescimento, da idade infantil, 0 a 6 anos, ao completo amadurecimento dos 18 aos 24 anos.
Durante os períodos sensíveis a energia vital (horme) que impulsiona e guia o desenvolvimento natural de cada ser humano, ativa uma determinada aprendizagem que a mente absorvente (mneme) registra de forma inconsciente.
É a mente absorvente que vai permitir que as condições da espécie sejam apreendidas pelo neonato de forma correspondente ao momento cultural. (em La mente Del bambino, Montessori cita o mimetismo como comparativo; seria esta uma forma de defesa para o ser jovem da espécie inserir-se no seu grupo?).
Vale registrar que a descoberta de Montessori data do início do século passado, pois foi em 1909 que publicou Pedagogia Científica. Hoje, a pesquisa na área da neurociência mostra que 90% dos neurônios na primeira infância são neurônios espelho, potencializando a capacidade de absorver as informações do ambiente, primeiro por imitação, depois por representação e finalmente por criação, o que confirma as conclusões de Maria a respeito dos processos formativos pelo qual passa o ser humano do nascimento a idade adulta.
Vejamos o que Montessori diz sobre os períodos sensíveis para a aquisição da linguagem articulada, 0 a 2 anos e meio.
“O mecanismo da linguagem deve preexistir às outras atividades psíquicas que devem utilizá-lo. Isto acontece porque são dois os períodos do desenvolvimento da linguagem: um inferior, que prepara as vias nervosas e os mecanismos centrais que devem fazer o “aport” entre as vias sensoriais e as motoras e outro superior, determinado pela atividade psíquica que exterioriza, por meio de pré-formados mecanismos da linguagem.”
“Os sons da linguagem vem a formar um centro auditivo. Entre a produção daqueles mesmos sons se forma um centro motor. A conexão entre os dois centros é a via inter central de associação.”
Assim, depois do longo silêncio dos primeiros meses a criança inicia um longo período de exercícios psicomotores (vocalizações e balbucios) para fazer com que os órgãos materiais estejam prontos quando a maturação mental atingir a capacidade de abstração e simbolização, isto é a compreensão da palavra no seu significado semântico, compreensão que precede sempre a primeira enunciação verdadeira e própria, isto é a primeira palavra intencional.
Em “Il segreto dell”infanzia” lemos:
“Assim acontece a aquisição da linguagem, entre os sons do ambiente confusos e de tão variadas procedências, como se estivesse cumprindo um combinado, a criança se faz sentir e distinguir como se estivesse atraída e fascinada pelos sons singulares da linguagem articulada ainda incompreensível...
Então as próprias fibras da criança se escutam. Não todas as fibras, mas aquelas que tenham nascido para guiar de modo regular e ordenado a “construção da linguagem articulada.”
Tudo isto acontece nos primeiros meses de vida e termina por volta dos três anos. Neste período, sem esforço a criança constrói a linguagem de sua gente (língua materna), a linguagem oral. Se aos três anos esta conquista não é efetivada ela a fará com maior esforço e talvez com a ajuda de algum método terapêutico e mesmo que fale poderá fazê-lo de modo imperfeito.
Em “La mente Del bambino”. encontramos o gráfico no qual Montessori registra o desenvolvimento da Linguagem e a partir do qual podemos concluir que os períodos sensíveis que antecedem cada aquisição, sendo assim:
0 aos 3 meses – desenvolvimento da audição
0 aos 4 meses – desenvolvimento da visão
0 aos 6 meses – desenvolvimento dos aspectos motores da fala
0 a 1 ano – desenvolvimento do significado da palavra
0 a 1ano e 6 meses – absorve a estrutura da língua materna e inicia a utilização do substantivo, continuando este trabalho até que aos dois anos e meio já seja capaz de utilizar as frases e diferentes funções gramaticais
Ainda no que se refere à aquisição da linguagem oral, quando ingressa no pré-escolar da educação infantil, a Casa dei Bambini, dos 3 a 6 anos, a criança apresenta como característica a capacidade de absorver o vocabulário e construir a consciência da estrutura da linguagem.
Sobre este aspecto diz Montessori:
“A linguagem já existe ao fim dos dois anos e meio, ela já está completa não só na construção da palavra, mas na construção do discurso. Todavia permanece a sensibilidade para a construção da linguagem que neste ponto se volta para fixar os sons e adquirir um grande número de palavras.”
A Educação da Linguagem a que Montessori se refere está diretamente voltada para as oportunidades que a criança terá no ambiente em que vive, um ambiente de linguagem culta e rica trará potencializará esta linguagem. A criança construirá seu vocabulário através das suas vivências e do que copiará dos adultos à sua volta.
Ambiente bem cuidado gera uma educação bem cuidada e a tarefa que cabe aos pais é saber qual é o mundo que querem apresentar às crianças. Que cuidados devem ter para que sua criança construa um vocabulário rico e apropriado, que aprenda a usar palavras e cortesia, que nomeie corretamente os elementos da vida cotidiana e o que conhecer da natureza, que aprecie uma boa música , desenvolva o prazer por ouvir histórias...
Tudo isto resultará em crianças falantes, capazes de expressar seus sentimentos e desejos com propriedade, capazes de narrar pequenos fatos do cotidiano e despontar para o segundo passo da construção da linguagem – o da linguagem escrita com um rico acervo linguístico.
Bem, mas isso é outra história que trataremos no nosso próximo texto.
Por Marcia Righetti. Especialista e Coach em Educação Montessori. Fundadora da Aldeia Montessori, Rio de Janeiro e do Centro de Estudos Montessori do Rio de Janeiro.
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